Teste de cabelo: uma estratégia de condução sob a influência ineficaz no Brasil

O Brasil continua sua batalha contra as taxas de acidentes rodoviários que estão entre as mais altas do mundo. Em 2015, uma lei foi promulgada para estabelecer um teste obrigatório de “janela de detecção ampla” para substâncias psicoativas (exceto álcool) em amostras de cabelo para obter ou renovar uma carteira de motorista profissional.

Os dados fornecidos pelo Departamento de Transporte Nacional sobre os resultados toxicológicos oficiais realizados para os efeitos desta nova lei de março a dezembro de 2016 foram divulgados recentemente. Entre todos os estados brasileiros, foram realizados 1.042.148 testes para esta nova lei, resultando em 16.264 (1,6%) resultados positivos para uma ou mais substâncias. Não foram divulgados dados sobre a prevalência de substâncias específicas testadas.

Embora a análise de cabelo ofereça uma grande janela de detecção para muitas substâncias, a taxa de positividade encontrada foi menor do que a revelada por pesquisa anterior em que amostras de fluídos orais ou de urina foram coletadas aleatoriamente de motoristas profissionais nas estradas brasileiras. Por exemplo, as taxas de positividade para os canabinóides, a cocaína e as anfetaminas em conjunto variaram de 5,2% utilizando fluído oral para 8,1-9,3% em amostras de urina.

Em geral, a coleta de cabelo é considerada um procedimento não-invasivo por toxicologistas; no entanto, a coleta de amostras de cabelo tem sido mal realizada no Brasil (por exemplo, as amostras são retiradas em grandes quantidades da mesma região da cabeça ou, se a pessoa não está calcada, são coletadas amostras dos cabelos). Estes procedimentos afetaram a aparência física de muitos motoristas, além do fato de que o cabelo corporal pode indicar uma janela de tempo de detecção superior à exigida pela lei (90 dias). Além disso, muitos motoristas relataram não poder pagar o teste, que custa aproximadamente US $ 100.

Os defensores desta nova legislação afirmam nos meios de comunicação populares que a implementação de testes obrigatórios de drogas para cabelos para motoristas profissionais foi responsável por reduzir todos os acidentes envolvendo caminhões nas estradas federais brasileiras em até um terço. No entanto, os dados apresentados não possuem suporte para revisão pelos pares e não são confiáveis ​​em um país onde a condução sob a influência (DUI – driving under the influence) não é coletada sistematicamente e está sujeita a muitos preconceitos.

Na verdade, isso é altamente improvável, já que os países desenvolvidos só alcançaram uma redução significativa nos acidentes de trânsito vários anos após a adoção de políticas de segurança do tráfego baseadas em evidências e campanhas de conscientização. Além disso, os índices de especificidade e sensibilidade necessários para o teste de drogas para cabelos que seria esperado por razões judiciais, como as exigências da lei, ainda não são satisfatórios, aumentando assim a controvérsia para um achado positivo como um método efetivo de dissuasão.

A implementação desta nova lei no Brasil tem sido extremamente dispendiosa e causou constrangimento para os motoristas durante a coleta de amostras. Acima de tudo, é uma medida extremamente pouco confiável do ponto de vista da saúde pública, pois identificou menos de 2% dos motoristas como potenciais usuários de substâncias psicoativas, gastando recursos que poderiam ser direcionados para estratégias de aplicação de DUI baseadas em evidências, como álcool aleatório na estrada e testes de drogas.

Um vídeo de um trabalhador que mostra o constrangimento que passou ao ter que fazer o exame na ocasião do desligamento do seu trabalho:


Addiction – SSA Society for Study of Addiction
Autores:

Vilma Leyton, Gabriel Andreuccetti, Antonio Edson Souza Meira Júnior, Marcelo Filonzi Dos Santos, Henrique Silva Bombana, H. Chip Walls, Julia Maria D’Andrea Greve, Heraclito Barbosa de Carvalho, José Heverardo da Costa Montal, Flavio Emir Adura, Mauricio Yonamine

Vídeo: Luis A. Festino – Diretor de Assuntos Trabalhistas da NCST

 

 

DATA

14 novembro 2017

FONTE

Luís Festino - Diretor de Assuntos Trabalhistas da NCST