Não somos caminhoneiros, somos motoristas profissionais empregados!

“Todas as reivindicações são justas, mas legal somente aquelas que têm como princípio garantir e preservar o bem estar dos cidadãos e da sociedade”.
Mais uma vez estamos à volta com o debate a respeito da “GREVE DOS CAMINHONEIROS”, regidos por um sistema de governo nos marcos capitalistas, onde todas as reivindicações são justas, mesmo quando ela parte da classe patronal.

Porém todas devem ter como princípio a garantia mínima dos direitos dos trabalhadores e a garantia do bem estar da sociedade.

O Brasil vive dentre as inúmeras mudanças e adaptações sociais, politicas e econômicas, um novo marco na reestruturação do setor de transportes de cargas, com as questões de infraestrutura, logística, das precárias condições das malha viária, além dos novos marcos regulatórios, seja nas relações comerciais ou nas relações trabalhistas e previdenciárias. Já no setor de passageiros, a questão da mobilidade e das novas tecnologias, tem sido o grande desafio.

Estas mudanças e adaptações, principalmente no de cargas e logísticas, já vêm se “manifestando”, desde os meados da década de noventa, particularmente fustigada pelo crescente número de acidentes de trânsito nas rodovias e com as precárias condições da infraestrutura na nossa imensa malha viária.

Após a vitória do presidente Lula e com o advento da lei 11.442/2007, que regulamentou o transporte de cargas no Brasil, por conta de terceiros e mediante remuneração, revogando a Lei no 6.813, de 10 de julho de 1980, ocasionou um relativo aumento de investimentos na década de 2000, provocando uma certa calmaria no setor.

Naturalmente com a promulgação da lei 11.442/2007, seus reflexos logo passaram a incomodar outros seguimentos, particularmente nos trabalhadores empregados do transporte rodoviário de cargas.

Inicialmente, criou-se uma falsa expectativa, principalmente no setor de empresas de transporte de cargas, entendendo seus departamentos jurídicos, que estariam resolvidos de vez às reclamatórias de ex-motoristas que reclamavam na Justiça do Trabalho e, com isso, estariam às empresas livres para efetuarem as contratações de transportadores autônomos, sobretudo em razão do que dispõem os artigos 2º e 4º da referida Lei.

Entretanto, após várias análises mais cuidadosas da nova norma, não deixou dúvida de que pouco ou nada mudou com seu advento. O artigo 2º estatui que “a atividade econômica de que trata o art. 1º desta Lei é de natureza comercial, exercida por pessoa física ou jurídica em regime de livre concorrência, e depende de prévia inscrição do interessado em sua exploração no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Cargas – RNTR-C da Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT”, sendo exercida por Transportador Autônomo de Cargas – TAC e por Empresa de Transporte de Cargas – ETC.
Após estas e outras contradições, fruto da “acomodação” estrutural que buscava o setor, foi inevitável, que também os representantes dos trabalhadores, fossem compelidos a entrar de vez nesses debates sobre a contemporaneidade do Transporte rodoviário no Brasil.

Com um pouco de atraso, algumas “articulações” em andamento na esfera legislativa e governamental, feita por dirigentes ou grupos de dirigentes sindicais, acabaram sendo incorporadas pela CNTTT – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestre, através de um GT Grupo de Trabalho.
Este grupo constituído por integrantes de quase todas as federações de trabalhadores estabeleceu junto às representações patronais do setor vinculadas a CNT Confederação Nacional do Transporte, uma discussão mais ampla, mas com base nas seguintes reivindicações: 1) Regulamentação da profissão do motorista; 2) Aposentadoria Especial; 3) Fim da Dupla função, e; 4) O Estatuto do motorista. Este debate acabou por se estender para outras questões das relações de trabalho, que afligia o sistema como todo.

Com tal extensão, as discussões acabaram por envolver o Ministério Público do Trabalho – MPT, que por ofício vinha suprindo a ausência da ação de muitos sindicatos de trabalhadores, para um necessário equilíbrio das condições de trabalho, particularmente no setor de transportes de cargas, onde acabou por “sedimentar” o debate em torno, principalmente das condições de trabalho, tanto de empregados, quanto de autônomos.

Nesta seara, dar-se-á início a uma tentativa de construção de uma legislação única, para “organizar” e “normatizar” toda a relação de trabalho dos motoristas, surgindo daí com a participação do MPT, o texto construído de forma tripartite (CNT, CNTTT e MPT), que “gerou” a lei 12.619/2012.

Como não poderia ser diferente, a construção desta proposta, não foi uma tarefa simples e de total consenso, em dados momentos, foi necessário demonstrações de “força” lado a lado, com os representantes dos trabalhadores superando os debates, diante do quadro conjuntural estalado.

Após a aprovação e sansão da lei, exaustivamente debatida, setores da sociedade, particularmente o agronegócio, se organizaram para “boicotar” a nova norma, tudo porque, como já apontado por diversas vezes, a reorganização e aplicação da lei, diminuiria o lucro dos produtores e dos grandes embarcadores.

Nesse momento, inicia-se mais uma batalha, agora pela implementação da lei 12.619/2012, que do ponto de vista social, seu alcance tornou-se inquestionável. Mas os representantes do agronegócio, foram mais ágeis e determinados de nós representantes dos trabalhadores, (motoristas empregados), lançaram uma campanha de “contra informação” na mídia e de forma incisiva nas redes de integração de transporte rodoviário, (postos de gasolinas, distribuidoras, revendedoras de veículos, revendedora de autopeças, etc.), acabando por disseminar uma divisão que na pratica nunca havia existido até então. “Venderam” para os motoristas autônomos, que eles eram empresários e que com a nova lei, jamais poderiam ter lucros com seus transportes, mas, na verdade quem teria seus lucros diminuídos, seriam os grandes embarcadores e os contratantes de fretes, nada mais justo do que eles terem que reajustar os fretes para os motoristas autônomos e para as transportadoras, para que estes adequassem a nova lei.

Buscando reverter à situação, os embarcadores e o agronegócio, investiram pesado nas entidades representantes dos motoristas autônomos, levando de “roldão”, setores das transportadoras, que tentarão se beneficiar com a “confusão” causada pelo Projeto de Lei 4246/2012, aprovado pelo Congresso Nacional, que no momento encontra-se para sansão ou não com a Presidência da República.

Portanto são tais entidades que promovem as “greves locaute”, que tem como principal objetivo desta vez, pressionar o governo para não vetar artigos da lei, que são totalmente inconstitucionais. Caso a presidente Dilma Rousseff não vete estes absurdos, estará consolidada uma legislação que transcenderá os princípios de que os direitos e bem estar dos cidadãos brasileiros, estão em primeiro lugar.

E para nós representantes dos trabalhadores em transportes rodoviários, fica a certeza de que os caminhoneiros autônomos saíram da categoria de TRABALHADORES, para ocupar a categoria de PATRÕES. Por mais justa que seja as suas reivindicações, elas não são as nossas, portanto assim devemos tratá-los nas relações trabalhistas.

Nós não somos CAMINHONEIROS, somos motoristas profissionais EMPREGADOS, e os nossos interesses estão em jogo, devemos nos organizar e mobilizar para defendê-los, mas este movimento de caminhoneiros que se arrasta por dias, nada tem a ver com as nossas reivindicações, pelo contrário, depõe contra elas. Fica ai nosso alerta e nossa modesta contribuição para reflexão do movimento sindical de trabalhadores em transportes rodoviários.

Luis A. Festino
Diretor de Assuntos Trabalhistas da NCST

Omar José Gomes
Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres e 1º Vice-Presidente da NCST

DATA

26 Fevereiro 2015

FONTE

NCST