CUT se une a empresários na votação do projeto que altera a Lei do Descanso

O presidente da CNTT-CUT, Paulo João Estausia, demonstrou total desconhecimento a respeito da Lei durante a votação do PL 041/2014 no Senado nesta terça-feira. Uma entidade que se denomina defensora de trabalhadores esteve no Senado ao lado dos empresários, gigantes do agronegócio que tentam de todas as formas ter o máximo de lucro, mesmo que isso custe a vida de muitos trabalhadores.

A CUT deveria, assim como fazem os reais defensores dos trabalhadores, lutar por melhorias, por melhores salários e condições dignas de trabalho. Não foi o que aconteceu com a Lei do Descanso. A CUT deu as costas para os trabalhadores e escolheu o lado dos patrões.

Por causa desse tipo de apoio, de falsos defensores dos trabalhadores, os motoristas do Brasil podem perder direitos que levaram dezenas de anos para serem conquistados. Não se pode concordar jamais que defensores de trabalhadores lutem para que eles percam direitos e diminuam o seu ganho mensal.

Vejam as alterações na lei comentadas pelo Procurador do Trabalho Paulo Douglas de Moraes:

Lei 12.619/2012 X PL 041/2014

A análise das emendas aprovadas no Senado demonstra que, a despeito de um avanço importante no que diz respeito ao limite de jornada, mantido em oito horas com possibilidade de duas horas extras, os motoristas consolidaram vultosos prejuízos quando comparado o projeto com a Lei n. 12.619/12.

Períodos de descanso

Embora referido no Plenário, não se viu avanços no que diz respeito ao intervalo de descanso entre um dia e outro de trabalho.

Ao contrário, a emenda de plenário nº 6, inicialmente acolhida pelo Relator, ao final foi aproveitada pela metade, deixando de fora exatamente o avanço anterior relativo ao motoristas de coletivo urbano, aos quais seria garantido o descanso interjornada de onze horas, salvo eventual fracionamento autorizado por instrumento coletivo.

Portanto, o texto que retorna para a Câmara prevê que o intervalo para repouso e alimentação noturna foi efetivamente reduzido de onze para oito horas, inclusive para motoristas de transporte coletivo de passageiros urbano.

Tempo de direção contínuo

Ainda quanto a intervalos de descanso, outro retrocesso consolidado no Senado diz respeito ao limite de condução ininterrupta, que sobre de 4 para 5 horas e meia, fato que aumenta exponencialmente o risco de acidentes por excesso de fadiga.

Tempo de espera

O tempo de espera, que poderia ser iniciado apenas após o término da jornada normal de trabalho, com a proposta pode ser iniciado a qualquer momento. Além disso, pela proposta, o tempo de espera passará pode se dar concomitantemente com os períodos de descanso, ou seja, enquanto o motorista conduz o veículo estará legalmente dormindo.

Ainda quanto ao tempo de espera, a proposta extraída do Senado manteve a redução de 130% para apenas 30% com relação ao tempo de espera.

Tempo de reserva

Com relação à remuneração do tempo de reserva (caso de condução compartilhada por dois motoristas) a proposta simplesmente elimina a remuneração de 30% sobre o salário-hora.

Mas não é somente isso, quando a condução for em dupla, o descanso diário obrigatório com o veículo parado que era de 6 horas, deixa de ser diário, passando a ser exigível apenas a cada 72 horas de trabalho. A questão é: quem consegue realmente repousar com o veículo em deslocamento?

Limite de jornada

Diversamente da Lei n. 12.619/12 que admitia a extrapolação da jornada sem um limite definido apenas para situações de força maior, a proposta corroborada pelo Senado mantém as hipóteses de condução sem quaisquer limites. Sendo assim, ao conduzir carga viva, carga perecível ou mesmo que o motorista entenda que o local não oferece segurança, fica autorizada a condução até que encontre um local seguro ou até o destino final. Conclui-se, assim, que dependendo da justificativa, a proposta não prevê qualquer limite de jornada.

Pagamento por comissão

A modalidade de pagamento é outro grande prejuízo com o qual o Senado concordou. A proposta sugestiona o pagamento por meio de comissão, ao contrário da Lei n. 12.619/12 que em regra veda essa forma de pagamento que leva o motorista a se submeter “voluntariamente” à sobrejornada em busca de uma remuneração decente.

Fiscalização

A efetividade da fiscalização do efetivo cumprimento dos intervalos de descanso e do tempo de direção é outro aspecto prejudicial que fora assentido pelo Senado. Na Lei n. 12.619/12 os contratantes do serviço de transporte, notadamente as embarcadoras, vinham obrigadas a impedir que o motorista que nela carregasse ou descarregasse seguisse viagem sem comprovar o descanso de 11 horas. Esta obrigação ficou praticamente anulada na proposta.

Motorista auxiliar

Embora não conste da Lei n. 12.619/12, digno de nota outra desastrosa inovação da proposta apresentada pela Câmara e aprovada no Senado. Trata-se do Transportador Autônomo Auxiliar  (TAC Auxiliar) que, sem possuir caminhão algum, passará a “auxiliar” um motorista autônomo sem qualquer vínculo de emprego. Trata-se de uma fraude legislada.

Vigência da Lei

No que diz respeito à sua vigência: é uma verdadeira teratologia jurídica e lógica, traduzindo um prejuízo para todos os destinatários da lei.

Ao prever um vácuo jurídico de 180 dias combinada com a eficácia de importantes dispositivos à homologação de trechos de rodovias supostamente hábeis a garantir a parada adequada dos motoristas, se terá uma total insegurança jurídica, em prejuízo direito aos motoristas, transportadoras e também aos contratantes do serviço de transporte. Todos perderão.

Tal fenômeno ocorre porque não se está num vácuo jurídico. Temos leis em vigor: a Lei n. 12.619/12 e, antes dela, a CLT, o que equivale a dizer que durante os seis meses de ineficácia da “nova lei” valem as leis atualmente em vigor.

O mesmo raciocínio vale para o período de ineficácia nos tais trechos não homologados.

Ocorre que, mesmo alertados, os artífices dessa proposta não adotaram as providências para corrigir esse grande erro.

O desarranjo que essa solução produzirá decorre do fato de que essa insegurança jurídica só é percebida por bons advogados, procuradores e juízes. Já os motoristas autônomos, “chefes” de TAC Auxiliar e empresários do transporte imaginarão que voltou o Estado sem lei que existia antes da Lei n. 12.619/12.

O texto da Câmara é ruim no mérito e pior ainda na forma, assim como, infelizmente, o texto aprovado no Senado.

Comentários do Procurador do Trabalho Paulo Douglas de Moraes

DATA

11 junho 2014

FONTE

FETROPAR